04/08/2025
Secretaria Municipal de Educação de Irati afirma que a medida segue exigências legais e necessidade de ajustes; pais e comércio local relatam as consequências na rotina, que impactará 88,4% das empresas, de acordo com pesquisa realizada pela Aciai
Desde a última semana, os Centros Municipais de Educação Infantil (CMEIs) de Irati passaram a funcionar em novo horário: das 8h às 17h. A alteração, que reduz uma hora na jornada anterior, vem gerando preocupação entre famílias, especialmente aquelas com rotina atrelada ao comércio e ao setor privado.
Vitoria Yanca, mãe do pequeno Davi, de três anos, é uma das trabalhadoras afetadas. Funcionária do comércio, com expediente das 9h às 18h, ela relata as dificuldades enfrentadas desde a alteração: “A mudança dos horários nos influencia diretamente, pois em questão de horário de comércio, trabalhamos das 09h às 18h. E com essa mudança, das 08h às 17h, complica a parte de com quem deixar a criança, porque o comércio não vai se adaptar a este horário. Então, no nosso caso, precisamos de alguém para buscar o filho porque a empresa não vai nos liberar para buscar. Isso nos influencia, pois temos que pagar alguém para pegar ele, ter com quem deixar depois deste horário. E tem muitas pessoas que não tem com quem deixar, como é o meu caso, que não tenho minha mãe por perto e a sogra também trabalha”. Vitoria lamenta porque precisa pagar uma pessoa para buscar e ficar com seu filho.
Ela também questiona se alguma mudança será feita no comércio para acompanhar a nova realidade. “Fica a minha dúvida para a Prefeitura, Aciai e os comerciantes: eles vão adaptar este horário do comércio para acompanhar os CMEIs? Ou vão voltar a funcionar no horário anterior?”, comenta.
A realidade é semelhante para Lays Oliveira, mãe de um bebê de um ano. Também atuando no comércio, ela diz que a adaptação tem um custo alto. “Faz pouco tempo que meu bebê está no CMEI. A avó tem ido buscar porque está de férias do trabalho, mas ainda estamos vendo como vamos fazer quando ela não puder mais. Já fizemos uma pesquisa para pedir para alguém pegar ele no fim da tarde e ficar até a hora de eu sair do serviço, mas compromete mais ou menos 25% do meu salário”, afirma. Lays é mãe solo e é a única responsável por manter seu filho.
88,4% das empresas sentirão o impacto
Uma pesquisa realizada pela Associação Comercial e Empresarial de Irati (Aciai), entre os dias 21 e 24 de julho, revelou que 88,4% das empresas consultadas preveem atrasos ou saídas antecipadas de funcionários devido à nova carga horária dos CMEIs. Além disso, 76,8% se manifestaram a favor da manutenção do atendimento até as 18h.
Entre os principais impactos relatados estão a redução da produtividade, a necessidade de reorganização de turnos e dificuldades na contratação, especialmente de mulheres com filhos pequenos. A entidade aponta ainda que a medida pode acarretar prejuízos diretos às empresas e às famílias, e defende a criação de alternativas como escalonamento de horários e contratação de mais profissionais.
Em nota oficial, a ACIAI declarou: “A manutenção do horário até as 18h é necessária para garantir segurança às crianças, tranquilidade às famílias e continuidade da produtividade nas empresas. […] Que haja diálogo constante com os setores produtivos antes da implementação de medidas que impactem diretamente a rotina das empresas e da comunidade trabalhadora”.
Em entrevista, a secretária municipal de Educação de Irati, Eliceia Halatiki Szereda, explicou os motivos que levaram à alteração na jornada dos CMEIs.
“A principal razão que levou a Secretaria Municipal de Educação de Irati a implementar a redução da carga horária dos CMEIs foi a readequação da oferta e a verificação do tempo de permanência realmente necessário das crianças nos CMEIs, com base em estudos e dados concretos. Além disso, a adequação buscou ajustar a presença de professores de educação infantil em número compatível com a demanda nos horários de pico, pois com as escalas para atendimento da jornada alargada de 11h, havia uma falta de profissionais nas horas mais intensas, de chegada e saída das crianças”, afirma Eliceia. Ela argumenta que o ajuste viabilizará melhor organização no fornecimento desse serviço público.
Segundo a secretária, a demanda foi identificada no início deste ano. “A necessidade de adequação da carga horária nos CMEIs foi identificada a partir de uma avaliação interna conduzida pela Secretaria Municipal de Educação de Irati, sendo importante ressaltar que essa demanda vem sendo discutida há anos pelos profissionais da área, no entendimento da necessidade de observar critérios para oferta e permanência dos alunos na Educação Infantil”. A secretária complementa que a equipe técnica da Secretaria, em diálogo com órgãos de controle, identificou que o tempo de permanência de 11 horas diárias não encontrava respaldo legal como critério universal para o atendimento em tempo integral.
Eliceia também esclareceu os aspectos legais que embasaram a decisão. “A legislação brasileira – por meio da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB) – estabelece que o atendimento em tempo integral na Educação Infantil deveria ter, no mínimo, sete horas diárias. Portanto, não existe obrigatoriedade legal para que o município ofereça 11 horas como padrão, e sim, garantir a qualidade, segurança e intencionalidade pedagógica dentro do tempo previsto por lei. Tal entendimento é reiterado pela Deliberação 02/2014 do Estado do Paraná, que estabelece as Normas e Princípios para a Educação Infantil no Sistema de Ensino do Estado do Paraná. Com base nesses dados e respeitando a legislação, o novo horário passou a ser das 8h às 17h, totalizando nove horas de atendimento, o que continua acima do mínimo exigido por lei”.
Para as famílias com necessidade comprovada, a Secretaria de Educação afirma estar oferecendo alternativas. “Para as famílias que, comprovadamente, necessitam de uma jornada ampliada, foi garantido um período de transição com entrada às 7h30 e saída às 17h30. Todas as famílias que necessitam estão sendo ouvidas. Essa mudança busca garantir um atendimento mais equilibrado, humanizado e sustentável, tanto para as crianças quanto para os profissionais da rede, assegurando o direito à Educação Infantil com qualidade, cuidado e responsabilidade”, assegura ela.
Ainda de acordo com Eliceia, houve escuta das famílias pelo município antes da decisão com um levantamento realizado no início de 2025, junto aos responsáveis pelas crianças matriculadas, por meio de questionários aplicados diretamente às famílias. Os resultados revelaram que grande parte dos alunos já não utilizava o atendimento em tempo integral (11 horas) e que o horário mais demandado concentrava-se no período de 8h às 17h. Outro levantamento realizado focou nas declarações de trabalho dos genitores, que demonstravam a real necessidade de horário de permanência das crianças nos CMEIs.
Sobre o diálogo com os pais, a chefe da pasta destaca que a Secretaria de Educação caminhou com muita conversa e transparência neste processo. “Desde o mês de junho, todos os Cmeis tiveram reuniões onde foram discutidas as questões da redução da carga horária, momento em que foram ouvidos os pais e verificadas as necessidades de cada família”, afirma Eliceia. E para quem teve dificuldades na adaptação, segundo ela, houve apoio para todas as famílias que comprovaram a necessidade, com ajuda neste período de transição com a extensão do horário ofertado.
A mudança no horário dos CMEIs também repercutiu no setor privado. Bruna Carli, proprietária de um Centro de Educação Infantil particular em Irati, relatou que houve aumento na procura por vagas, após a alteração na rede pública.
“Tenho o Centro de Educação Infantil já faz três anos. Atendemos crianças de zero a cinco anos. No período de férias, nós ofertamos colônia de férias, tanto de julho, como de final e início de ano. Abrimos a escola às 7h da manhã e fechamos às 18h, e sim, tivemos procura devido a mudança dos horários dos CMEIs, pois os pais relatam que os horários não encaixam com os horários de trabalho deles”, informa a pedagoga.
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Principais resultados da pesquisa da Aciai
Conhecimento da proposta de redução do horário:
73,9% sabiam da proposta
26,1% não sabiam
Formas de impacto relatada:
88,4% - Atrasos ou saídas antecipadas dos funcionários
39,1% - Redução da produtividade
27,5% - Necessidade de reorganização de turnos
26,1% - Necessidade de nova contratação
11,6% - Empresa não será afetada
1,4% - Já encontram dificuldades com o modelo atual
Opinião sobre a manutenção do horário até 18h:
76,8% são favoráveis
20,3% indiferentes
2,9% contra
Fernanda Hraber